sábado, 27 de janeiro de 2024

Suméria: o reinício da saga humana

 Cristiano De Mari


      A planície de Sennar ou Shinar, que os arqueólogos chamam de Suméria e aprendemos nas aulas de história ( no baixo vale do rio Eufrates, no centro do Iraque), é o lugar na visão bíblica e da arqueologia moderna onde a civilização começou, quer dizer; na verdade;  de onde ela recomeça seria o termo correto, o reinício.

        A irrigação da terra oriunda das técnicas humanas produzirá grandes quantidades de grãos e uma centralização da riqueza. Aqui está a primeira evidência de escrita e literatura, de direito, de cidades-estado, da roda de oleiro, do barco à vela, do arado, do trabalho em metal com bronze, de formas musicais e arquitetônicas avançadas; de tecelagem, couro e alvenaria. 

      Para os arqueólogos, o súbito aparecimento da civilização na Suméria é um verdadeiro enigma. E por que? 


* ** Porque não há evidências de quaisquer passos culturais pequenos e graduais que levem a isso. Simplesmente aparece de repente. Isto é difícil para a evolução explicar. 


     Mas é exatamente o que esperaríamos se realmente houvesse um Dilúvio, que acredito que aconteceu devido abundantes fatos, evidências, assimilações e contextualização adequada.

       A questão toda é iniciada pouco depois do Dilúvio, ou seja,  as pessoas, os clãs tribais iniciantes tentaram um regresso, uma imitação , um reinício ao tipo de civilização avançada que conheciam antes do Dilúvio.E isso só podia ser conhecido pela transmissão dos conhecimentos dos membros mais antigos dos clãs, justamente os que estavam na arca e conheceram o mundo antediluviano.    

     O mundo antediluviano até onde se sabe por meio de mitos, tradição patriarcal, livros de estudiosos , arqueologia perdida, tabuinhas Naacal encontradas na Índia, artefatos ( objetos, estatuetas, calçados, vestimentas, símbolos gravados, petróglifos) de datação muito antiga que superam os 12.000 anos, dentre tantas outras coisas que infelizmente são engavetadas pelo ensino convencional que não mostra toda realidade, era de fato um mundo avançado, com sua ciência, tecnologia, máquinas, governos, etc...

Mesmo assim, também teve suas falhas, porque o homem estando ele envolvido em más inclinações, de forma similar ao que acontece hoje em dia, resolveu muitas vezes colocar-se no lugar de Deus. E eis que veio o Dilúvio.

       Lembramos do trecho bíblico de Eclesiastes 1:9, que cai como uma luva perfeitamente para dizer que o mundo desde que foi criado é praticamente o mesmo, apenas mudando as épocas e os personagens humanos:


" O que foi tornará a ser; o que foi feito se fará novamente; não há nada novo debaixo do sol."


       Pois bem, retornando então , a Bíblia descreve que nas gerações que se seguiram ao grande Dilúvio mundial, contingentes  humanos desceram ao sul da Mesopotâmia como um grupo homogêneo e iniciou a primeira civilização numa “planície na terra de Sennar ; e eles habitaram ali” (Gênesis 11:2). 

     Esta terra  é “Shinar”, local da primeira civilização bíblica pós-diluviana, é o mesmo mesmo que  Suméria (ou “Shumer”). Os nomes territoriais, localizações e descrições coincidem estreitamente.

      A Bíblia descreve esta civilização como sendo fundada e liderada pelo infame ditador Nimrod, “um poderoso caçador diante do Senhor” (Gênesis 10:9). 




*** Importante: 


      Todos sabem que existiu uma tentativa primária de urbanização na região da Mesopotâmia liderada por Nimrod mas que pode ter sido milênios antes do surgimento da própria Suméria. Esta tentativa deve ter ocorrido algumas décadas ou séculos depois que a família de Noé saiu da Arca.

      É difícil prever um cálculo correto mas se a data base estiver correta , teremos o fim do Dilúvio em 10.000 a C. O projeto de Babel por Nimrod entre 9.500 e 9.000 a.C. Logo depois da dispersão , desta tentativa que foi frustrada por Deus, a humanidade se espalhou, as linguagens se diversificaram, Babel fica por muitos séculos abandonada , só depois vindo a constituir-se futuramente como Babilônia.  

      Nos milênios seguintes e obscuros a humanidade migra , mistura-se,  vai se reorganizando e depois aparecem as cidades-Estado, e os sumérios sim,  descendentes de Nimrod iniciam a primeira civilização humana do pós-dilúvio em 3.200 a.C. Civilização que eu digo é de forma conjunta, homogênea, organizada em ampla rede de cidades-estado, cultura e desenvolvimento.

       E tudo praticamente surge como que num de repente, como se algo estivesse esperando o momento certo para mais cedo ou mais tarde vir a luz.

     Lógico que muitas vilas antigas de culturas primitivas e centros de urbanização podiam ser encontrados entre 7.000 e 5.000 a.C., Jericó  e Çatal Huyuk são exemplos disso;  mas ainda não eram uma civilização avançada como a Suméria. A Suméria foi um conjunto formador sob vários fatores humanos.

     Por isso, Nimrod é descrito como fundador da Suméria devido seu legado passado de construtor, personalidade épica e patriarca gerador.

      Entendam que na Bíblia, principalmente no Gênesis, nem tudo acontece em sequência de tempo próxima, existem grandes lacunas de tempo que não são preenchidas ou mencionadas pois realmente os povos estavam migrando, trabalhando, tentando sobreviver e muitas coisas não vieram à tona pois tudo era transmitido pela oralidade, pela transmissão oral dos eventos antigos antes de serem escritos.


***


     Alguns estudiosos como o egiptólogo David Rohl, identificaram Nimrod com o rei sumério Enmerkar. As consoantes iniciais de ambos os nomes, NMR,  correspondem (o hebraico é escrito sem vogais) e o “kar” em sumério pode significar “caçador”.

      A Bíblia descreve Nimrod estabelecendo sua civilização na terra de Sennar/Suméria, com capital em Babel , ele também liderou o estabelecimento de cidades-estado em outros lugares. Versículos 10-12:


" E o princípio do seu reino foi Babel, e Erech, e Accad, e Calneh, na terra de Sinar. Dessa terra saiu Assur e edificou Nínive, e Reobote-ir, e Calá, e Resen…." 


       As cidades-estado acima  foram todas catalogadas pela arqueologia como os primeiros centros de civilização na Mesopotâmia. Babel, o projeto que não deu certo, é claro, milênios depois correspolnderia à futura Babilônia histórica. Erech é a histórica Uruk (que se acredita ser a origem do nome territorial Iraque). Accad é, obviamente, a cidade-estado-reino de Akkad acima mencionada. Assur ( vem do patriarca Assur, semita , filho de Sem que habitou próximo de Nimrod) também corresponde a uma cidade com o mesmo nome que mais tarde daria origem à civilização de dos Assírios. Nínive é a famosa capital assíria de mesmo nome. E Calah é a cidade assíria de Kahlu. 

       Nimrod era descendente de Cam, identificado como o pai da raça negra. O nome do filho de Cam (e pai de Nimrod), Cush, significa “ moreno ” (e “Cushita” é o nome antigo e bíblico dos africanos ao sul do Egito, também Reino de Kush). 


***Seria apenas uma coincidência os sumérios se autodenominarem "Saggiga" , traduzindo: “Os homens de Cabeças Negras ”? Poderia ser uma ligação com o fundador original destas cidades-estado?   Provavelmente sim.




 * A Bíblia prossegue descrevendo a história da confusão das línguas em Gênesis 11:1-4:


      " E toda a terra tinha uma só língua e um só discurso. E aconteceu que, enquanto viajavam para o leste, encontraram uma planície na terra de Sinar; e eles habitaram lá. E disseram: 'Venham, vamos construir para nós uma cidade, e uma torre, cujo topo chegue ao céu." 

     Em outro texto “épico”, Enmerkar ( nome similar a Nimrod, possivelmente a mesma pessoa) descreve uma de suas cidades como uma “cidade que vai da Terra ao céu ” ,  e façamos a nossa fama e nosso nome ; para que não sejamos espalhados por toda a face da terra.’

       O relato descreve Deus testemunhando a confusão homogênea da humanidade e prevendo uma queda de volta ao hedonismo pré-diluviano, prediz nos versículos 6-9 de Gênesis capítulo 11:


  " Eis que são um só povo, disse ele, e falam uma só língua: se começam assim, nada futuramente os impedirá de executarem todos os seus empreendimentos. Vamos: desçamos ( esse verbo está no plural, " desçamos" seria uma alusão à Trindade? Pai , Filho e Espírito Santo? Tirem suas conclusões).Vamos: Desçamos para lhes confundir a linguagem, de sorte que já não se compreendam um ao outro.”  

       Então o Senhor os espalhou dali por toda a terra; e eles pararam de construir a cidade. Por isso se chamou o seu nome Babel; porque o Senhor confundiu ali a línguagem de toda a Terra.

Fragmento do tablete de Enmerkar ao Senhor de Aratta

       Este antigo documento sumério data de cerca de 2.100 a.C. Mas o seu relato é muito mais antigo do que a própria data de criação do documento/tablete em muitos séculos ou até milênios).

      Ele conta a história de um diálogo muito antigo ( entre o rei sumério Enmerkar e outro governante, o Senhor de Aratta, a respeito do envio de um tributo para construir uma torre. 


**** A antiga terra de Aratta pode ter uma relação com o Ararat bíblico.


     Enmerkar ameaça que se o tributo não chegar, ele causará estragos na terra de Aratta “ como uma devastação que varreu destrutivamente” (possivelmente evocando um  Dilúvio?). No meio da longa inscrição, encontramos o seguinte parágrafo:


      " Cante para ele… o encantamento de Nudimmud: “… todo o universo, as pessoas bem guardadas – que todos eles se dirijam a Enlil juntos em uma única língua para os senhores ambiciosos, para os príncipes ambiciosos, para os reis ambiciosos – Enki, o senhor da abundância… mudará o discurso nas suas bocas, tantos quantos ele colocou lá, e assim o discurso da humanidade é verdadeiramente um.”

      Aqui, no contexto da tentativa de construir uma torre (especificamente, uma enorme estrutura mesopotâmica conhecida como zigurate), está um encantamento para tentar fazer com que todas as pessoas falem a mesma língua. Vemos que o deus Enki, “senhor da abundância”, “colocou” muitas línguas entre as nações – e este encantamento pretendia que a humanidade pudesse trabalhar em conjunto com uma língua. Esta não é a única tradução possível do texto; aqui está outra tradução alternativa:


     "Certa vez... todo o universo, as pessoas em uníssono, falaram com Enlil em uma só língua. Então Enki, o senhor da abundância mudou o discurso em suas bocas, trouxe contenção para ele, para o discurso do homem que tinha sido um.

      O governante deste texto, o sumério Enmerkar, desejava a unidade da linguagem para cumprir seus objetivos de construção de torres – uma unidade que já existira, mas não existia mais, devido à intervenção divina.




      A motivação dos construtores de Babel era clara: façamos um nome( fama) para nós mesmos (Gn 11.4), ou seja, tornemo-nos famosos. Esse orgulho foi demonstrado em uma enorme torre que construíram no meio da cidade. Isto foi mais do que um simples monumento. Tinha um propósito religioso e pagão, como pode ser visto no nome da cidade: Babel (ou Babilônia), do acadiano Bab-illi que significa a porta de deus ou a porta dos deuses.* 

      Esta torre pretendia conectar o céu e terra , literalmente: e seu topo estará nos céus (Gn 11:4). Em outras palavras, era um símbolo da tentativa do homem de alcançar Deus por meio de sua própria força e de suas próprias habilidades.

       Há um detalhe interessante relacionado na Lista de Reis Sumérios sobre o indivíduo que governou pouco antes de Enmerkar – um indivíduo chamado Meskiag-kasher (um possível paralelo a  “Cush” filho de Cam). A Lista de Reis menciona este governante indo para o mar e desaparecendo. Poderia isto ter constituído uma migração de cushitas/sumérios precoce para África, levando consigo a língua suméria? 


*** E poderia isto explicar as numerosas semelhanças observadas entre a língua bantu da África Oriental e a antiga língua suméria?  

      Cada um tire sua conclusão, mas no que depender da verdadeira pesquisa arqueológica , da verdadeira ciência documental, provavelmente um dia todas as peças desse quebra-cabeça que é a saga humana se encaixarão perfeitamente. Muito já se descobriu , muito já está em andamento e muito ainda há por vir.


Referências: 

https://armstronginstitute.org/280-the-sumerian-problem-evidence-of-the-confusion-of-languages

https://www.totheends.com/tower.html?fbclid=IwAR2QdrKzUZ0Ljpfwzx2Ln7qd_czpCM4Ac15pUo1OxurSOwaD7UC1h8F1HSQ